Rute Costa, SC Braga

"Qual o impacto que esta epidemia está a ter na tua vida... Tanto a nível pessoal como desportivo?

Esta epidemia surgiu de forma inesperada e alastrou-se rapidamente por várias zonas do mundo. No nosso país, a situação não foi diferente, podendo qualquer um de nós estar exposto ao vírus e nas suas mãos, em relação às consequências. Todos os seres humanos, ricos ou podres, homens ou mulheres, crianças, jovens, adultos e idosos estão a ser afetados. Ninguém está a salvo e todos nós estamos a perder algo à conta desta epidemia.

A nível pessoal tenho alguma dificuldade em fazer um balanço negativo acerca de toda esta situação. Isto porque, é claro que tive que me limitar e até mesmo, me privar de certos comportamentos que neste momento são de risco. Já estou em casa há 29 dias e embora goste de desfrutar do meu espaço, sinto alguma falta de pequenas coisas que fazia habitualmente, como ir às compras, ir experimentar um restaurante novo e conviver socialmente com as pessoas mais próximas, em espaços públicos. No entanto, toda esta situação também está a ter algumas vantagens. Pessoalmente estava numa fase de vida bastante acelerada, porque tinha que conciliar todas as minhas atividades desportivas profissionais, com outra atividade profissional que exercia e que estava a ocupar o meu tempo livre. Portanto, houve uma desaceleração positiva da minha rotina que me permitiu dispensar tempo para outras coisas que tinha em mente fazer quando tivesse tempo.

Por outro lado, a nível desportivo a situação é mais dramática. Deixei de treinar com a minha equipa diariamente e os meus domingos deixaram de ser ocupados com os jogos de Futebol. Por agora não há forma de saber quando e em que condições iremos regressar aos relvados e isso, acaba por me entristecer e inquietar um pouco. Em todo o caso, o Sporting Clube de Braga tem feito um excelente trabalho para nos manter com a cabeça naquilo que são as nossas obrigações para com o clube e estarmos totalmente preparadas para quando for altura de regressar.


Que cuidados tens diariamente? O que tens feito para te manter ocupada nesta quarentena?

Acredito que a nossa máxima preocupação e responsabilidade nesta fase, deve ser a de ficar em casa e sair, exclusivamente, em situações de extrema necessidade, ou seja, para comprar alimentos ou medicamentos. Restringir o contacto social às pessoas com quem partilhamos a casa e evitar o contacto físico com essas mesmas pessoas, é uma das preocupações que estou a ter. Os cuidados de higiene, como lavar muitas vezes as mãos e da forma que é recomendada, estão presentes em grande número, todos os dias. Cuidar do meu bem-estar físico e mental é a minha grande preocupação neste período de tempo e por isso, cumpro uns certos hábitos e rotinas.

Na minha opinião, manter uma rotina diária é um fator chave para passar melhor o dia-a-dia. Por isso, levanto-me todos os dias à mesma hora, tenho o cuidado de preparar um pequeno-almoço saudável e diferente todos os dias, faço algumas tarefas em falta e preparo-me para o treino online com as minhas colegas de equipa e STAFF. Depois disso, é tempo de tomar um bom duche e preparar o almoço. Almoçar e jantar com os meus pais, para além de ser reconfortante, também acrescenta alguma normalidade a toda esta situação.

Na parte da tarde, embora dispense mais algum tempo para fazer um segundo treino físico ou algumas brincadeiras com uma bola de futebol, aproveito o resto do tempo para me dedicar a outras atividades, sobretudo do meu gosto. Tenho dedicado bastante tempo à leitura porque é algo que realmente gosto de fazer e que me permite de certo modo, afastar-me de tudo o que é tecnológico e virtual. Mas ainda assim, perco algum tempo a atualizar-me de conteúdos digitais do meu interesse, como a alimentação, a saúde, o exercício e o bem-estar. Aproveito esse conhecimento que vou adquirindo para experimentar uma ou outra nova receita e apurar as minhas capacidades na cozinha, para implementar estratégias que me ajudem a aumentar o meu bem-estar mental e potenciar a minha componente física.

Faço questão que a música faça parte do meu mundo todos os dias, deixando que provoque sentimentos e emoções positivas. Por outro lado, evito que os filmes e séries ocupem o meu dia, gosto que sejam uma atividade esporádica para não transmitir uma ideia de excesso de tempo livre. Para terminar, continuo a deitar-me cedo todos os dias e a dormir as horas recomendadas, para poder começar um novo dia da melhor forma. Descansada e cheia de energia para cumprir com as obrigações diárias que estabeleço.


O que achas que vai mudar em "nós" ou o que devia mudar depois disto tudo se dissipar?

Seria completamente anormal não retirar qualquer lição de toda esta situação e espero, sinceramente, que todas as pessoas tenham a preocupação de retirar uma ou várias lições de vida. É tempo de refletir sobre as várias áreas da nossa vida, de avaliar a nossa conduta, os nossos comportamentos a nível individual e social, formular algumas perspectivas sobre aquilo que poderá ser o futuro e sobretudo, adquirir ferramentas e estratégias que nos permitam ser pessoas melhores no final de tudo isto.

Fundamentalmente, nesta situação é gritante a regra de que ninguém é superior a ninguém. Estamos todos na mesma condição. Revelou-se um estado de fragilidade humana nunca antes vista ou sentida. Não há estatutos sociais, não há género, não há idades. Somos todos iguais. Todos nós estamos a sofrer consequências.

Esta fragilidade, esta ausência de poder de decisão, esta impotência, está a aproximar-nos uns dos outros. E isto, é sem dúvida um ponto muito positivo. A capacidade para pensar no outro, para nos preocuparmos com algo para além de nós próprios e todas as ações com o propósito de ajudar alguém, independentemente de quem seja, são o reflexo de uma disposição mental para fazer o bem, que devia ser regra na nossa sociedade. É maravilhoso!

Infelizmente, pela parte de alguns "seres humanos" também há uma predisposição para fazer o mal, aproveitando-se desta situação para prejudicar os outros em benefício próprio. Terá de haver sempre pesos nos dois lados da balança? Talvez sim! À medida que o tempo passa, tenho o profundo desejo que pese mais o lado bom, aquele é verdadeiramente digno do ser humano que fica com o coração alegre e a palpitar, quando ajuda genuinamente os outros sem esperar nada em troca.

Em jeito de conclusão, não julgo que toda esta situação nos queira mostrar que precisamos de viver e experimentar tudo de uma forma intensa e imponderada. Muito pelo contrário, penso que tudo isto parece querer mostrar-nos que precisamos de desacelerar a nossa passada, ou seja, deixar de correr apressadamente de um lado para o outro e passar a caminhar lentamente. Pois, acredito que a este ritmo teremos capacidade para priorizar e prestar atenção às coisas que realmente são importantes para cada um de nós e que nos fazem verdadeiramente felizes."

                                                                                                         Rute Costa


Raparigas da Bola

© 2016 Raparigas da Bola, Portugal

DESIGUALDADE DE GÉNERO NO DESPORTO É EXPOSTANuma semana marcada pelo Dia da Mulher e pelas maiores conquistas portuguesas de sempre no europeu de atletismo, as notícias que se seguiram a estes dias evidenciam a diferença de importância dada à mulher no desporto.

Em geral, é preciso uma mulher ganhar uma medalha para que ela tenha destaque e mesmo quando isso acontece, a visibilidade não é das maiores, como foi visto esta semana.

Ser uma mulher no desporto não é fácil. A falta de visibilidade, a falta de patrocínios e a falta de interesse geram um ciclo que torna complicada a formação de atletas mulheres de ponta.

O grupo Raparigas da Bola luta para quebrar este ciclo, dando voz e visibilidade a atletas femininas, de diferentes modalidades desportivas.

Percebendo-se que no Dia da Mulher há uma tendência para falar sobre mulheres, mas que logo no dia a seguir tudo volta à triste normalidade, o grupo resolveu intervir, usando os próprios jornais desportivos como ponto de partida.

A iniciativa intitulada #ElasTambémJogam, consistiu em transformar todas as notícias publicadas nestes jornais, no dia 9 de março, num gráfico dividido em duas cores: uma para os homens e outra para as mulheres.

Esses gráficos transformaram-se em verdadeiros jornais, mas sem nenhuma foto ou texto, só as cores que evidenciam a diferença de atenção dada às mulheres. Os jornais foram entregues a jornalistas, inluenciadores e atletas para que estes amplificassem o alcance desta ação, ainda no dia 09.

O desejo do grupo não é confrontar os jornais, pelo contrário, é fazer deste um momento de reflexão para que todos se possam unir e dar mais visibilidade às mulheres no desporto, já que elas acreditam que a partir daqui é possível começar a mudar este ciclo de desigualdade. «Mais visibilidade gera mais interesse do público, que desperta interesses de marcas, que gera investimentos e consequentemente volta a gerar visibilidade.» relata Marta Faria, fundadora do Raparigas da Bola.

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